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ARTIGO

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, ECONOMIA SOLIDÁRIA E EDUCAÇÃO AMBIENTAL: UMA ABORDAGEM TEÓRICA

Silvana Maria Pereira da Silva


1. INTRODUÇÃO
Em relação à conceituação de Desenvolvimento Sustentável, existem alguns conceitos diferenciados a respeito. Para dizer que o meio ambiente e o desenvolvimento podem caminhar lado a lado, uns chamam de desenvolvimento local, outros de desenvolvimento sustentável, mas adota-se aqui o conceito de economia solidária. Como uma alternativa, proporcionando um desenvolvimento social, ambiental e por que não econômico?
Quanto à conceituação da economia solidária, apresenta concepções divergentes. Chega-se ao cúmulo de “priorizar” o aspecto econômico da economia solidária, o que consequentemente a desvirtua. A Economia Solidária para que seja efetivada é necessário que seus atores sejam reconhecidos no processo, pois ela não é apenas uma técnica, mas um modo de vida, onde é cultivado: o respeito à natureza, às pessoas, às mulheres, aos jovens, aos negros, em fim aos diversos grupos sociais e éticos considerados à margem da sociedade. Mas será focalizada aqui a relação entre desenvolvimento e meio ambiente, pois correrá o risco da pesquisa tornar-se inexeqüível.
A questão problema consiste no seguinte: Quais contribuições a Economia Solidária tem proporcionado para a superação da dicotomia entre desenvolvimento e preservação ambiental nos Projetos de Assentamento de Reforma Agrária Catingueira e Poço Baraúna? Poder-se-ia questionar a respeito do por que realizar uma pesquisa a respeito da economia solidária em se tratando de meio ambiente e desenvolvimento. A resposta é simples, é impossível trabalhar com economia solidária desrespeitando o meio ambiente ou qualquer um de seus componentes. Poder-se-ia questionar também a respeito da relevância de pesquisar meio ambiente e desenvolvimento. A resposta também é simples, não é por estar na “moda”, mas é puramente necessário que a sociedade, como um todo, perceba que meio ambiente e desenvolvimento, podem sim serem trabalhadas juntas.
Acredita-se que esta pesquisa possa revelar à sociedade a extrema importância de se respeitar o meio ambiente como também revelar alternativas para o desenvolvimento, concomitantemente. É de suma importância a realização desta pesquisa, pois por meio deste busca-se a análise da realidade, como também uma intervenção desta realidade.
Em síntese, está mais evidente que nunca, que Economia Solidária é o caminho para o desenvolvimento social, ambiental e econômico dos P.As Catingueira e Poço Baraúna. Considera-se de extrema relevância o estudo das contribuições da economia solidária em sentido amplo na efetivação de uma sociedade sustentável tanto em termos econômicos como ambientais e sociais. Pois ela não é somente economia, mas envolve toda uma questão de consciência, e nesse processo de apropriação e conscientização os/as atores acabam fazendo a Economia Solidária de fato.


2. BASE TEÓRICA

De início será abordada a conceituação de conceito. Para posteriormente adentrarmos na conceituação de desenvolvimento, desenvolvimento sustentável e economia solidária. Para em seguida aprofundar-se em algumas das questões dos assentamentos de reforma agrária de forma mais analítica e dialética. A palavra dialética por sua vez vem do grego (διαλεκτική, era), na Grécia Antiga, a arte do diálogo, da contraposição e contradição de idéias que leva às novas idéias. A conceituação de conceito de acordo com PIERSON (1968, apud ÁVILA, 2000):

Os conceitos constituem as ‘ferramentas’ do nosso trabalho. Habilitam-nos a investigar discriminar, comparar, classificar e relacionar. São especialmente significativos para as ciências sociais porque a linguagem, da qual todos eles derivam, é ela mesma, um dos fenômenos que, como técnicos desta ciência, estudamos e procuramos compreender’ (p.17).

O que nos revela que enquanto cientistas sociais não há como emudecermos diante os conceitos, pois eles são nossas ferramentas de trabalho. O conceito é em outras palavras, é o que fazemos com ele, não sendo estático, perfeito, ou acabado (ÁVILA 2000). O conceito de uma forma ou de outra acaba sendo transformado e questionado pelos pesquisadores que o estudam.
Em relação à conceituação de desenvolvimento CUNHA (1994, apud ÁVILA 2000), faz a seguinte afirmação:

Etimologicamente o conceito de desenvolvimento é ‘[...] formado pela junção de três outros vocábulos: des [...] do prefixo latino dis [...] coisa ou ação contrária àquela que é expressa pelo termo primitivo [...] + en [significado em grego (...) posição interior, movimento para dentro] + volver (virar, voltar, dirigir)’. Etimologicamente desenvolvimento quer dizer tirar-o-que-cobre (grifo meu). (p.20).

Portanto, desenvolvimento significa “tirar-o-que-cobre”. Quer dizer, o desenvolvimento possibilita que sejam feitas novas descobertas, outras possibilidades de intervenção na realidade. Faz com que seja vista todas as possibilidades de uma determinada realidade, proporcionando deste modo o desenvolvimento. O debate sobre desenvolvimento sustentável surge em contraposição ao modelo de desenvolvimento baseado na industrialização, na segunda metade do século XX. Enquanto conceito é muito conhecido o estabelecido em 1997 no Relatório da Comissão Brundtland, como processo que satisfaz as necessidades do presente, sem comprometer a capacidade das gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades (BEZERRA e FREITAS, 2006).
Para SACHS (1990 apud BEZERRA e FREITAS, 2006) o desenvolvimento sustentável deveria está baseado nos seguintes princípios: “[...] a prudência ecológica, entendida como condição para a qualidade de vida; a eficiência econômica, capacidade de produzir mais e melhor com economia de recursos, capital e trabalho; e a justiça social, oportunidades semelhantes para todos (as)” (p.13). De acordo com BEZERRA e FREITAS (2006). O desenvolvimento local vai além da lógica estritamente econômica, pondo em evidência à necessidade de se considerar as dimensões de sociabilidade:

[...] a gestão local do desenvolvimento sustentável tem com fim maior a construção de sociedades sustentáveis que possam compartilhar entre si, o cuidado com o planeta, o cuidado com todas as formas de vida, agora, no futuro e sempre. Falar sobre uma sociedade sustentável implica em falar de multidimensionalidade; implica em falar sobre a sustentabilidade ambiental, ecológica, demográfica, cultural, social, política, institucional, econômica, científico-tecnológica. Implica falar sobre as dimensões ‘invisíveis’ da sustentabilidade, incluindo nesse rol a chamada dimensão espiritual (p.15).

O que significa ter em conta o bem-estar coletivo das comunidades (quase sempre descuidado, pelo “mercado”); o respeito pelas culturas e identidades locais – não se concebendo, portanto, que estas sejam constrangidas/adaptadas em função dos “grandes projetos” nacionais de crescimento econômico. Assim, bem-estar, sustentabilidade, meio ambiente, diversidade cultural e pluralidade identitária são dimensões centrais no conceito de desenvolvimento local/sustentável. Embora pareça utópico e inatingível, concorda-se com JARA (2000) quando citado por BEZERRA e FREITAS (2006):

Quando a confiança, a compaixão, a solidariedade, o amor e a beleza, todos os elementos invisíveis e não racionais forem incorporados aos valores característicos do desenvolvimento é que será possível acessar o ideal de desenvolvimento sustentável (p. 48).

Parece um tanto utópico essa concepção de desenvolvimento sustentável, mas acredita-se aqui que tudo é um processo. Se nunca for iniciado, ele nunca será acabado. Outra questão é a necessidade de conscientização/apropriação dos atores desse processo.

[...] a idéia de sustentabilidade implica na premissa de que é preciso definir uma limitação nas possibilidades de crescimento e um conjunto de iniciativas que levem em conta a existência de interlocutores e atores sociais relevantes e ativos através de práticas educativas e de um processo de diálogo informado, o que reforça um sentimento de co-responsabilização e de constituição de valores éticos (Jacobi, 1999 apud Tavares, 2005, p.122).

A concepção de sustentabilidade adotada aqui, vai de acordo com a questão da apropriação por parte do sujeito na realização de seu trabalho. É interessante lembrar que a conceituação de sustentabilidade é bastante ampla, englobando a utilização dos recursos naturais de forma racional, pensando nas gerações futuras. Não que esteja sendo defendido aqui o princípio da intocabilidade dos recursos naturais, o que tornaria essa discussão um tanto romântica. Mas ressalta-se a necessidade de retirarmos os recursos da natureza de forma sustentável. Que “(...) significa poupar recursos naturais administrados com a preocupação de garantir a continuidade e a regularidade da atividade econômica e a qualidade do ambiente, condição para a qualidade de vida (...)” (TAVARES, 2005). A este respeito é importante lembrar que a solidariedade para com as gerações futuras somente tem sentido se nos solidarizarmos inicialmente com os marginalizados da atualidade (SACHS, 1993).
A Economia Solidária foi reinventada na segunda metade da década de 70, e o que a diferencia é à volta aos princípios, à democracia e à igualdade dentro dos empreendimentos. O avanço da Economia Solidária não prescinde inteiramente do Estado, mas esta economia necessita de uma auto-emancipação.

A economia solidária foi concebida para ser uma alternativa superior por proporcionar às pessoas que a adotam, enquanto produtoras, poupadoras, consumidoras, etc., uma vida melhor. Vida melhor não apenas no sentido de que possam consumir mais com menor dispêndio de esforço produtivo, mas também melhor no relacionamento com familiares, amigos, vizinhos, colegas de trabalho, colegas de estudo etc.; na liberdade de cada um de escolher o trabalho que lhe dá mais satisfação; no direito à autonomia na atividade produtiva, de não ter de se submeter a ordens alheias, de participar plenamente das decisões que o afetam; na segurança de cada um saber que sua comunidade jamais o deixará desamparado ou abandonado. (SINGER: 1994, p. 114-115).

É por esta e outras razões, que este trabalho busca defender a economia solidária como articuladora entre desenvolvimento e meio ambiente, revelando sempre que esta relação não é antagônica, mas possível e bastante viável.


3. CONCLUSÃO

É chegado o momento das conceituações trabalhadas anteriormente serem contextualizadas em algumas das questões dos assentamentos de reforma agrária, de forma mais analítica e dialética. Com base em uma música de Chico Buarque, ALENCAR (2000, p. 91) afirma ser necessário cantar a canção afirmando que os assentamentos significam a esperança, que produzem mais e melhor que os imóveis desapropriados. Que os assentamentos de reforma agrária representam uma opção ao problema da fome e da miséria nacional; a possibilidade concreta de apoio e segurança alimentar; uma opção de geração de emprego e renda, não apenas para as categorias sociais excluídas do campo, como também para um segmento do setor urbano, desde técnicos de nível superior, nível médio dentre outros.
Para analisarmos uma determinada situação ou acontecimento devemos levar em consideração o contexto histórico em que está inserido. Mas ao se analisar a história, tem de se adotar uma perspectiva de não linearidade, porquanto a história representa um movimento de avanços, recuos, paradas do homem no seu fazer diário (ALENCAR, 2000). Portanto, desde nosso nascimento entender o processo pelo qual passamos é uma tarefa um tanto quanto difícil, talvez se deva a isso o fato de muitas situações e acontecimentos perder-se no esquecimento de uma vaga lembrança. A partir de uma compreensão do que vivemos possamos entender como isso acontece com o ser humano.
SALES (2005, p.180) fundamentado em Gramsci, afirma que pode existir uma distância entre a concepção falada e o que concretamente se pratica, convém tentar construir uma concepção mais unitária, unindo o vivido e o pensado, o estrutural e o superestrutural, de um modo mais profundo. Afirma ainda que as classes subalternas (neste caso os assentados) estejam precisando aprofundar a sua pedagogia de educação popular. Seria o aprofundamento de um modo de sentir/pensar/querer/agir profundo e coerente na busca de realização de seus interesses em suas práticas econômicas, políticas, culturais. E até citar a dimensão afetiva dessa pedagogia.
Marx e Angel apud CHRISTOFFOLI (2004, p. 63) afirmam que o trabalho é a condição fundamental da vida humana. E ao passo que o homem modifica a natureza ele acaba por modificar a própria natureza, desenvolvendo suas faculdades, que estavam adormecidas. Portanto, é nesse processo de transformação externa e interna, que o ser humano se apropria, toma consciência de seu trabalho e consequentemente de sua própria existência. Mas vale salientar que, o contrário também pode acontecer, quando o trabalho passa a ser exploratório.
Partindo dessa concepção entende-se a economia solidária como sendo um poderoso instrumento de combate á exclusão social, por possibilitar a geração de trabalho e renda, além da satisfação direta das necessidades de todos (FERNANDO, 2007, p. 5).
Em síntese, o desenvolvimento sustentável, juntamente com a economia solidária e a educação ambiental são os pilares de um mundo mais justo, humano e solidário. Já que as mesmas pregam os mesmos e estão intimamente interligadas em uma relação bastante complexa. È bastante interessante perceber que existem alternativas ainda, neste período de contradições em que o planeta está passando. Onde prega que temos que consumir e consumir, ao passo que já está mais que comprovado que o planeta Terra não suporta este modelo de sociedade capitalista, injusta e desigual.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALENCAR, Francisco Amaro Gomes de. Segredos Íntimos: A gestão nos assentamentos de reforma agrária. Fortaleza: UFC, 2000.

ÁVILA, Vicente de et al. Formação educacional em desenvolvimento local: relato de estudo em grupo e análise de conceitos. Campo Grande: UCDB, 2000. 100p.

BEZERRA, Antonia Geane Costa Bezerra & FREITAS, Dione Maria de. Gestão Local do Desenvolvimento Sustentável. Natal:RN, AACC, 2006.

FERNANDO, Mineiro. O que é Economia Popular e Solidária. In: economia solidária. Setembro/2007 (Cartilha de Economia Popular e Solidária).

CHRISTOFFOLI, Pedro Ivan et al. A Constituição e desenvolvimento de formas coletivas de organização e gestão do trabalho em assentamentos de reforma agrária. São Paulo: CONCRAB/MAPA, 2004 (Caderno de Cooperação Agrícola nº 11).

SACHS, Ignacy. Estratégias de transição para o século XXI: desenvolvimento e meio ambiente; tradução Magda Lopes. – São Paulo. Studio Nobel: Fundação do Desenvolvimento Administrativo, 1993 – (Cidade Aberta).

SALES, Ivandro da Costa. Os desafios da Gestão Democrática da Sociedade. Edições UVA, Recife: PE, Editora da UFPE, 2005.

SINGER, Paul. Presente e Futuro. In: Introdução à Economia Solidária. São Paulo: Difusão Européia do livro, 1994 (Capítulo IV). P. 109-125.

TAVARES, Everkley Magno Freire. Avaliação de Políticas Públicas de desenvolvimento sustentável: dilemas teóricos e pragmáticos. Natal-RN: Revista Holos (CEFET), 2005.